quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

MUSICAL CHAPTERS IV

 MAIS DO QUE DANÇÁVEL

     Os ouvidos delicados de uma ínfima minoria sentem-se ofendidos com o ruído dos concertos de rua. São gratuitos e só vai quem quer. E o cartaz regra geral é muito variado, há sons para todos os gostos, todos igualmente respeitáveis, mesmo que eu não goste. Normalmente vai muita gente a qualquer destes concertos. Eu só vou de vez em quando porque a enchente é de facto grande e o risco de ver sobretudo cabeças e ouvir mais o ruído dos espectadores do que a música também é frequente. Fui ver os HMB e não me arrependi, pelo contrário. Além do que já era expectável, trouxeram músicos convidados, entre eles, um saxofonista (Zé Maria) e um trompetista (Diogo Duque). A combinação foi excelente. Aos ritmos soul e funky juntou-se a toada jazz dos instrumentos de sopro. E improvisar daquela maneira não é para todos.

     O recinto estava cheio e pulsava de entusiasmo. Meio mundo sabe as letras das canções e canta em uníssono, alguns batem palmas e a maioria regista o momento nos seus smartphones para depois inundar as redes dizendo “Eu estive aqui!” em vez de dizerem “Os HMB estiveram aqui e valeu mesmo a pena vir ouvi-los!” Claro que aqui e ali os decibéis subiram um pouco de mais como acontece em quase todos os concertos ao vivo. Há gente lá bem ao fundo e todos querem ouvir, cantar e dançar.

     Quase todos os temas dos HMB são muitíssimo dançáveis, têm uma cadência bem ritmada que faz o corpo mexer-se espontaneamente. É quase impossível não dançar, bambolear o corpo e deixar os braços voar. Mas os HMB vão mais além: brincam com as palavras e os sons. As palavras são elas mesmas música, a forma como são entoadas torna-as parte da melodia, da harmonia e do ritmo. Se alguém tentar cantar alguns daqueles temas a capella verifica isso mesmo. A música não vem só dos instrumentos, vem também das palavras e da forma como são segmentadas, prolongadas, cortadas, repetidas com uma respiração própria. Muito provavelmente, o background de gospel de alguns dos intérpretes tem muito a ver com isto. Nos segmentos em que ficam apenas as palmas e a voz essa afinidade torna-se mais evidente. E já alguém viu um cantor de gospel ficar imóvel? O ritmo vem da alma e contagia o corpo e alma soa cá fora nos movimentos cadenciados e na voz.

     No panorama da música portuguesa da última década, os HMB foram e são criativos, fizeram a diferença e têm um som próprio. As parcerias com outros artistas, os trabalhos a solo do próprio Héber Marques e a fusão de estilos mostra que são versáteis, inovadores e que ainda têm muito para dar.

*********************************************************

HMB Live in Benfica, photography by São Ludovino.


HMB Live - photography & video by São Ludovino.


HMB Live in Benfica, photography by São Ludovino.

HMB Live in Benfica, photography by São Ludovino.

HMB Live in Benfica, photography by São Ludovino.

HMB Live in Benfica, photography by São Ludovino.


******************************************************

HMB


Héber Marques (vocals)
Fred Martinho (Frederico Martinho) (guitar)
Daniel Lima (keyboard)
Joel Silva (drums)
Joel Xavier (bass guitar)
Diogo Duque (trumpet)
Zé Maria (Gonçalves Pereira) (sax)
Hulda Marques (chorus)
Enoque Silva (chorus)
Guest: Matay (Rúben Matay Leal de Sousa)

HMB ao vivo nas Festas de Benfica, Lisboa, 23 de Junho de 2019.

Fotografia & vídeo: São Ludovino.

HMB – YouTube Channel

HMB – Contact


MUSICAL CHAPTERS III

 Lords of Doom – Sounds & Vibes Again

     O revivalismo não é enfadonho. Volta a viver o que já estava destinado a perdurar. Os clássicos de qualquer género de música, e há clássicos de géneros muito diferentes, são clássicos precisamente porque se continuam a ouvir com gosto ao longo do tempo. Mesmo quando nos esquecemos deles no meio da enxurrada de sons que vêm e vão, lembramos tudo de novo ao primeiro acorde. E nos acordes seguintes, o clássico já é um novo clássico, porque o tempo passou, porque envelhecemos ou rejuvenescemos, porque ouvimos de maneira diferente ou porque quem interpreta fá-lo de maneira diferente.

    Os Lords of Doom, com este nome tão tenebroso, trouxeram-nos de novo as colheitas e as castas musicais destinadas a não morrer. O tempo nada lhes rouba, só acrescenta ou faz mudar a forma como se ouve. Provavelmente, não há ninguém que não tenha a sua playlist de clássicos; uns podem ser os clássicos consagrados pelo tempo e/ou pela crítica, outros provavelmente são aqueles que as idiossincrasias de cada um elegeu, às vezes sem saber bem porquê, apenas porque sabe bem ouvir muitas vezes ou de vez em quando. Às vezes até podem ser arrumados no fundo da gaveta, mas mal se reencontram, reconhecem-se de imediato – “Ah, estavas aqui! Há quanto tempo te não ouvia!”

     Que passe, pois, o tempo, porque tem mesmo de passar, queiramos ou não; e que fiquem os clássicos, que entre muitos dons têm o de fazer parar o tempo ou fluir na direcção e ritmo desejados. Se a música, de um modo geral, nos faz “respirar pelos ouvidos” (parafraseando David Gilmour), ouvir os clássicos faz-nos respirar com todos os sentidos, físicos e metafísicos.

     Desta vez, os Lords of Doom trouxeram mais um amigo, um pianista / saxofonista que veio dar mais colorido e vivacidade a algumas interpretações. Estão todos de parabéns. Voltem sempre! O revivalismo não é enfadonho e os Lords of Doom também não, sobretudo assim, tal como são, com naturalidade, sem pretensiosismos, apenas revelam o gosto pela música.

     Parabéns a todos pelo excelente trabalho!

Lords of Doom, photography by São Ludovino.

Lords of Doom, photography by São Ludovino.

Lords of Doom, photography by São Ludovino.

Lords of Doom, photography by São Ludovino.

Lords of Doom, photography by São Ludovino.


Sounds & Vibes Again with Lords of Doom, photography & video by São Ludovino.


********************************************      

     Já depois de ter escrito este pequeno artigo, soube que os Lord of Doom tinham mudado de formação e tinham adoptado um novo nome: são agora os DevEmpire. Que mania de adoptar nomes sinistros que podem induzir em erro os incautos… mas tem a sua piada, precisamente porque induz em erro mas não engana.

Contacto dos DevEmpire

Alexandre Rodrigues – Guitar Passion